sábado, 13 de fevereiro de 2016

DEPOIS DA CAÇA (EXCERTO) DE XAVIER OQUENDO


Meu avô e minha avó
tinham um caminhar maturo.
Ela, lenta no galope;
ele, acelerado e ágil.

Caminhavam a olhar a última traça
que deixara o animal do dia.
Ela seguia o passo do homem
como uma consequência natural.

O rio do meu avô
e da minha avó
não se parecem com o Guadalquivir
nem com o Guayas.
É-vos um rio de pedra que desce
sobre os carreiros
que faltam por conhecer
e penetrar.

A minha avó nada tem a ver
com a avó do Perencejo.
O Perencejo não tem esses carreiros
nem esse passo seguro e lento.
O avô do Fulano
não conhece o caminho que o meu avô guarda
no bolso:
carreiro extraviado
entre a menta e o “king” sem filtro
a que cheiravam as suas calças.

O meu avô parece-se com os astros.
A minha avó é um astro.
O meu avô parece-se com a minha avó
e ambos com as estrelas.

Não têm nada do Guayas nem do Guadalquivir.
Nem dos velhos Fulano e Perencejo.
Olhamos para eles
através das radiografias das suas pegadas.
Olhamos para os seus carreiros como esfinges
que herdamos para praticar a fé.
Não tem nada a ver com os meus sapatos tortos.

Caminharam os dous até ao vale da morte.
São um rio que esconde as águas
debaixo das pedras.


ANTES DA CAÇA
A meu pai

Quero encontrar o lugar
onde me situar.
Entro na vizinhança
de vozes que me dizem:
                              vai procurar longe
                                            nos cais das mágoas,
                              vai pôr-te na fila com os astros;
                                            deixa um bocadinho o poema,
                                            e reconhece os olmos.
                                            Acha que já incomodas
                                                           que em grande um se deforma
                                                                          e se consome.

Mamã já não prepara bem as ceias,
não há jantares até depois do dia.
Vai procurar o círculo vicioso
que possa tornar-te homem
na insónia dos dias.
                              Vai e não voltes
                                            até depois da caça.



A INVISÍVEL

Há alguém
noutra parte,
que olha para mim como para um espelho.
Que se põe a me remedar
no bordo.
Que se passeia por mim
como uma epidemia.
Segue-me até aos beiços,
aos narizes,
às mágoas.
Há alguém que quer apaixonar-se por mim
como se eu fosse um ator de cinema,
como se não houvesse mais domingos
para o parque,
como se o juízo final
tivesse uma sentença.
Há alguém que caminha pelas ruas,
mas no passeio da frente
há muito trânsito
e perdo-a.


© Texto: Xavier Oquendo Troncoso
© Tradução: Xavier Frias Conde

Sem comentários:

Enviar um comentário